Um vídeo gravado há 30 anos no Parque Estadual Marinho da Laje de Santos, a 40 quilômetros da costa de São Paulo, revelou a raia manta gigante (Mobula birostris) mais antiga já registrada no Atlântico Sul. As imagens foram recuperadas este mês por pesquisadores que estudam a espécie, considerada vulnerável à extinção.
A raia, de aproximadamente 5 metros de envergadura, foi registrada em 15 de novembro de 1988 pelo mergulhador Gabriel Ganme, hoje com 58 anos. Ele acompanhava um grupo até o rochedo, lar de centenas de espécies acima e abaixo da linha d’água, que mais tarde se consolidaria como uma área de preservação tornando-se o primeiro parque marinho paulista.
“Tínhamos acompanhado alguns astrônomos que iriam observar as estrelas a partir da Laje. Enquanto eles olhavam o céu, nós mergulhamos”, lembrou Ganme. Ele integrava uma expedição coordenada pelo instrutor de mergulho Clóvis Benno de Carvalho, já falecido, e considerado um dos precursores do esporte no país, assim como da exploração sustentável da Laje de Santos.
O encontro com a raia gigante ocorreu ao final do mergulho. “Estava amanhecendo, era perto das 6h. Eu filmei tudo o que tinha visto e, sem esperar, demos de cara com aquele animal magnífico, que gosta de interagir naturalmente. Ela se aproximou e nós ficamos maravilhados. Sem medo, admiramos aquele momento que foi muito especial”, conta, emocionado.
Três décadas depois, o vídeo que foi gravado em sistema analógico, em fita V8, foi recuperado na íntegra. “O Dr. Gabriel contou-nos que havia localizado essa fita, mas não fazia ideia se o conteúdo permanecia intacto. Recuperamos as imagens e encontramos o registro mais antigo da nossa história”, fala a coordenadora do Projeto Mantas do Brasil, a mergulhadora Ana Paula Balboni Coelho.
O Projeto, referência no estudo da espécie, conta com patrocínio pela Petrobras e pelo Porto de Santos – Codesp. Os pesquisadores conseguiram identificar pelas imagens que o animal trata-se de um macho adulto e aparentava estar em boas condições de saúde. As imagens do ventre da raia aparecem no filme com nitidez, de modo que foi possível registrar sua “identidade”, já que as manchas de cada manta são únicas, como as impressões digitais de humanos.
“Por enquanto, trata-se do registro mais antigo de que tivemos conhecimento no Atlântico Sul. Assim como os demais 157 registros de animais diferentes já catalogados no Banco Brasileiro de Mantas (BBM), que reúne todas as mantas identificadas na costa do país, o mergulhador que registrou o gigante marinho pôde batizá-la. Gabriel concordou em chamá-la de ‘Ganme'”, explica a pesquisadora.
Primeira Manta da temporada 2018
Em 29 de abril deste ano, mergulhadores registraram a primeira raia manta da temporada 2018 no entorno da Laje de Santos. O animal despertou a preocupação dos pesquisadores do Projeto Mantas do Brasil, pois as imagens captadas o mostram com petrechos de pesca enroscados. Nos dias seguintes, equipes do Projeto foram deslocadas ao local, mas não conseguiram localizá-lo.
Todas as raias identificadas são registradas pelas manchas que possuem no ventre (barriga) – elas funcionam como as digitais humanas. A foto identificação permite, por exemplo, estimar as rotas migratórias da espécie na costa brasileira, a partir de um eventual novo registro. Todos os registros estão concentrados na plataforma do BBM, que é de acesso universal e colaborativo.
Desde 2013 é proibida a da pesca da raia manta no Brasil. O Instituto Laje Viva, realizador do Projeto Mantas do Brasil, colaborou na intermediação de conversas com o Governo Federal, fornecendo informações técnicas que demonstram que os animais da espécie, que podem atingir 7 metros de envergadura e pesar 2 toneladas, estão em risco de extinção.